O Serviço de Assessoria Jurídica Universitária (SAJU) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), através do grupo G8-Generalizando - Direitos da Mulher e de Gênero, vem manifestar seu profundo repúdio à recente decisão da Presidenta Dilma em suspender o kit anti-homofobia, desqualificado pela ala conservadora brasileira como “kit-gay”.
A população LGBT vem sendo retratada ao longo dos anos de forma depreciativa e vexatória pelos meios de comunicação e diversas outras instituições da sociedade brasileira. Como sabemos, nos constituímos como sujeitos também a partir do diálogo com outro e da imagem que é feita de nós. Nesse sentido, os LGBT têm se constituído sujeitos no campo da abjeção, a partir de estereótipos que violam sua cidadania. Essa representação pejorativa justifica a baixa auto-estima que gera inúmeros suicídios entre @s jovens. Dessa forma, o kit de combate à homofobia traz a perspectiva de que os jovens LGBT possam se reconhecer, ser reconhecidos e representados como sujeitos de direito e de desejo no campo da humanidade e da cidadania.
Inúmeras são as pesquisas que revelam a gravidade da situação dos jovens LGBT nas escolas brasileiras. Citando algumas delas, podemos destacar o estudo intitulado "Revelando Tramas, Descobrindo Segredos: Violência e Convivência nas Escolas", publicado em 2009 pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, baseada em uma amostra de 10 mil estudantes e 1.500 professores(as) do Distrito Federal, o qual apontou que 63,1% dos entrevistados alegaram já ter visto pessoas que são (ou são tidas como) homossexuais sofrerem preconceito; mais da metade dos(as) professores(as) afirmam já ter presenciado cenas discriminatórias contra homossexuais nas escolas; e 44,4% dos meninos e 15% das meninas afirmaram que não gostariam de ter colega homossexual na sala de aula.
No mesmo sentido, a Fundação Perseu Abramo publicou em 2009 a pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais”, que indicou que 92% da população reconhece que existe preconceito contra LGBT e que 28% reconhece e declarou o próprio preconceito contra pessoas LGBT, percentual este cinco vezes maior que o preconceito contra negros e idosos, também identificado pela Fundação.
Frente a todos esses índices alarmantes, a decisão da Presidenta revela o que pode haver de pior na política brasileira: Direitos Humanos indisponíveis sendo utilizados em negociatas para abafar suspeitas de corrupção. A negociação escusa se deu frente aos olhos d@s brasileir@s e mostra que, mais uma vez, a pressão conservadora sai vitoriosa a despeito de todas as denúncias dos movimentos sociais e de todas as altas estatísticas que comprovam que os direitos da população LGBT estão sendo cotidianamente dizimados na sociedade brasileira. Nesse cenário de acovardamento, barganha e suspeitas de corrupção, nada surpreende que a Presidenta tenha vindo à público tratar dos temas “Palocci, Kit anti-homofobia e Código Florestal” em um mesmo discurso. Trata-se, evidentemente, de uma negociata política em que a vida de milhares de jovens LGBT constitui moeda de troca.
Absurda, ainda, é a pretensão do governo em criar “uma instância que vai dar o parecer final sobre publicações que versam sobre costumes”, conforme noticiado. Na possibilidade de tal instância ser composta por grupos políticos religiosos, teríamos abaladas as estruturas de um Estado verdadeiramente laico e democrático, livre de censuras e pressões que cerceiam a cidadania. A respeito disso, destacamos que dívidas assumidas em fase eleitoral para obter apoio de bancadas não podem estar acima dos compromissos firmados pelo Estado brasileiro em acordos internacionais, conferências públicas e no Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3), em que o compromisso com a pauta LGBT fora firmado.
Por todo o exposto, nos unimos em solidariedade aos milhares de ativistas, acadêmicos, ONG's, movimentos sociais e cidadãos comprometidos com a cidadania plena que estão, nesse momento, perplex@s diante desta decisão. Assim como el@s, clamamos por uma urgente revisão desta política de violação dos Direitos Humanos da população LGBT.
Serviço de Assessoria Jurídica Universitária - SAJU
Grupo G8-Generalizando: Direitos da Mulher e de Gênero